Ser Missionário

   Missão e "missões"- Existe isto?

"Deus vocacionou-me para missões. No próximo mês viajo para a China onde permanecerei por dois anos, evangelizando. Preciso das suas orações." Quando ouço apelos como este, meu coração se alegra por perceber como há pessoas que atendem, corajosamente, o chamado de Deus. A história da Igreja relata exemplos valorosos de cristãos que morreram por amor a Cristo, expressando a coerência e verdade da sua fé. Sair da terra e da parentela e ir para a terra onde Deus manda não foi realidade apenas para Abraão - hoje Deus nos vocaciona também. Você sente-se vocacionado? Se se sente, obedeça. Saia dos limites de Jerusalém e vá até os confins da terra. Deus estará com você, sempre!

Mas hoje o que se pretende aqui, é desfazer o equivoco de alguns/as, ao entenderem que "missões" (é a expressão corriqueiramente usada no nosso meio evangélico) reduz-se a ir para outros países, evangelizar a outros povos. Este equívoco tem dificultado a ação missionária do povo de Deus, inclusive dos/as metodistas. A impressão que se tem é de que só é missionário/a aquele/a que se muda de cidade ou de país obedecendo a um chamado de Deus. Assim o conceito de missão, ao invés de ser motivador à Igreja passa a ser um desalento. Mais ainda: tornar-se um inimigo da própria Igreja porque a desvia da sua essência: ser missionária.

Quando o termo igreja aparece no novo testamento, faz referência a um agrupamento de fiéis, unidos/as pela fé encarnada em Cristo Jesus. Pessoas comuns (inclusive traidores - Pedro; prostitutas - Maria Madalena ; crianças; inquiridores/as da fé - tomé e outros/as), tão comuns como nós, creram no ensino de Jesus. E após receberem o Espírito Santo não só creram com o coração, mas com a mente, com o corpo, com a vida. A fé deixou de ser religiosidade para ser vida, para ser estrada de discipulado. Aquele ajuntamento de pessoas só se justifica por uma única razão: o mundo inteiro, a partir da casa de cada um/a precisava reorientar-se, porque jazia distante do querer de Deus, ou seja, vivia em pecado absoluto. Isto se revela na vida ao seu redor: injustiça social, religiosidade hipócrita, muito desemprego, gente doente e marginalizada, boa-vida dos marajas(Herodes e cia.), acordos políticos feitos com o preço do desamparo dos trabalhadores escravizados. Nem em milagra se acreditava mais: viram um cego de nascença curado mas preferiram condenar a Jesus por causa daquela cura (João 9:11 a 334). Que mundo era aquele? Não era o mundo que Deus queria - Ele não se conformava com o que via. As crianças nem eram vistas como importantes no Reino de deus, a ponto de, até os discípulos, tentarem impedi-las de chegar a Jesus. Ora se um/a religioso/a, que se vê espiritual, e não vê a criança como legítima criação e objeto do amor de Deus, como poderá ser missionário/a Dele? A Bíblia inteira nos afirma que Deus quer novos céus e nova terra, com um povo transformado e guiado por escolhas dentro do querer Dele. Que grande desafio este. Pois é disto que se constitui a missão. Leia com muito temor e tremor, o Plano para a Vida e Missão da Igreja, que faz um estudo bíblico abençoado acerca do assunto. E mais que abençoado: ele nos confronta com os desígnios de Deus e nos deixa incomodados/as com a missão. E quando estudamos o Plano Nacional Missionário (PNM), então é que o coração fica ainda mais aquecido, porque nos traz ao grande apelo da palavra de Deus: "Ide e fazei discípulos ..." O estudo do Plano Nacional possibilita um incômodo gerado pelo Espírito Santo que nos impulsiona a sair "do banco" e ir "à luta" missionária. Deus tem falado ao Seu povo, inclusive aos/às metodistas, de forma clara e inconfundível: "todas as gerações, povos, raças e línguas precisam ouvir a mensagem do Evangelho e aceitar Jesus como seu único salvador e Senhor (Atos 4:12; MC 16:15; MT 28:18-20). " (Plano Nacional. p. 25). Como não louvar ao nosso Deus por tão grande feito? E mais motivos temos para glorificar os feitos do Senhor. Ele tem deixado claro à nós, metodistas (ramo da Igreja Universal de Jesus Cristo), que a missão não é voltada para os propósitos humanos e sim para os divinos. Aleluia! E isto implica em convicção dos elementos básicos e decisivos da "confissão de fé e ação missionária da  Igreja Metodista" (Plano Nacional Missionário, p. 28 a 32):

* A base da fé é a Bíblia;

* Piedade Religiosa e prática concreta da misericórdia são caminho indivisível de santificação;

* Sem a presença e poder do Espírito Santo, tudo é vão;

* A experiência com Cristo é o começo da vida cristã;

*Se há salvação, há paixão evangelizadora;

* Não se amadurece na fé sem educação cristã;

* A vida cristã legítima se reflete no mesmo compromisso que Deus tem: comprometer-se com o bem estar, ordem, paz, justiça e verdade na sociedade;

*Na vida cristã todos/as recebem o chamado, recebem os dons espirituais e são missionários - sacerdócio universal de todos/as os/as crentes;

* Como metodistas nos organizamos para a missão sob um sistema de governo episcopal;

* Assumimos uma mútua dependência no cumprimento da missão: somos conexionais;

* Cremos que a Graça é maior que a Lei e alcança o/a mais mísero/a pecador/a;

* Cremos que somos um corpo vivo, e não apenas uma organização que se vê como fim em si mesma;

* Fé e prática são um só, se se dividemn., não são legítimas;

* Somos mordomos/as de Deus e temos que cuidar desta terra: dos/as seus habitantes, dos seus rios, das suas florestas, do ar, dos animais - enfim, disto tudo que Deus criou e nos ofertou;

* Fuinalmente "resgatar o compromisso com a tradição do metodismo histórico de reformar a nação, em particular a Igreja, e espalhar a santidade sobre toda a terra, por meio de ações de anúncio, denúncia, ensino e serviços, recrutando e enviando missionários/as e desenvolvendo ministérios ." (PNN, p.32)

Há quase 40 anos atrás e extremamente atual, o bispo Almir dos Santos escreveu: "Vivemos numa realidade revolucionária em que não há possibilidade alguma de neutralidade. Convulvosões, tensões e profundas transformações constituem o cotidiano do nosso tempo. A nenhum observador perspicaz  pode fugir o sentido profundo da problemática que hoje reina no mundo e que a História no seu indecifrável vir-a-se lançou às nossas mãos. Em meio à confusão reinante, agravada em muito pela inépcia da análise superficial das falsas alternativas, distingui-se nitidamente a razão fundamental da crise assim como a sua grande vítima: O HOMEM. Na grande luta que se trava hoje no mundo joga-se com o destino humano. Questões econômicas, técnicas, científicas, políticas, militares assumem sentido a partir de uma "concepção de vida" e de uma visão da realidade. Isso significa afirmar que as questões econômicas, políticas, científicas, militares, técnicas, são questões de relevante significação humana e por consequência, são questões da mais séria reponsabilidade teológica. A presença, a mensagem e o testemunho da Igreja são válidos na medida de sua aptidão em penetrar no pulmão da História e tocar o nervo vital da humanidade." (Publicação do Gabinete Geral da Igreja Metodista -1967).

Irmãos e irmãs, que bênção é esta nossa identidade cristã metodista! Louvado seja Deus por ela. Com base única na Bíblia, temos clareza do que Deus quer de nós. Não há missão e "missões" - há uma só missão, que tem de ser cumprida aqui, ali, acolá! Ele nos envia à missão, tal como naqueles dias: desde Jerusalém (sua casa, seu bairro, sua cidade) passando por Samaria (Agreste, semiárido, margens do São Francisco, Porto de Galinhas , Natal, etc.) e até os confins do mundo. Irmãos e irmãs, neste tempo de campanha de expansão missionária nacional, somos gratos/as a Deus porque nos tem dado uma visão regional que permitirá o cumprimento da visão missionária nacional: Cada Metodista um/a missionário/a, cada lar uma igreja.

Marisa Coutinho - episcopisa da REMNE